Papo Firme é um quadro criado pelo amigo André Rocha onde são publicadas no blog "Futebol & Arte" entrevistas especiais feitas por ele. Nessa, pude ter o prazer de participar. E não contesto a afirmação de que Washington Rodrigues é um dos melhores analistas do futebol carioca.
Abaixo, para os leitores do "Futebol, Música e Etc", o texto redigido pelo André e importado do "Futebol & Arte" dividido em dois posts. Confira:
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Washington Rodrigues, o “Apolinho”
Ele tem 72 anos, sendo quarenta e seis envolvidos profissionalmente com o futebol. Começou como repórter de campo, onde, inclusive, ganhou o apelido de "Apolinho" porque usava um microfone sem fio similar ao utilizado pelos astronautas da missão Apolo, em 1969. Depois passou a ser comentarista e se consolidou como o principal analista de futebol da rádio carioca, sendo respeitado principalmente por sua imparcialidade nos comentários, mesmo sendo rubro-negro confesso e já tendo duas passagens pelo clube (1995, como treinador, e em 1998, como diretor de futebol). Trabalhou também em várias emissoras de TV aberta e comentou partidas da Copa de 1998 pela extinta TV Manchete.
Washington recebeu o “Futebol & Arte”, representado por André Rocha e Wilson Hebert, no seu escritório nas dependências da Rádio Tupi RJ (AM 1280 KHZ) e respondeu gentilmente as nossas perguntas. Seguem os melhores momentos do bate-papo, em duas partes:
PARTE I
Visão de jogo
Já que você tocou nesse ponto eu vou contar uma coisa que nunca comentei com ninguém: Tem coisas que eu antevejo no jogo, mas tenho medo de falar na hora da transmissão. Outro dia eu estava olhando para o campo e comentei em “off” com o Luiz Penido (narrador da Rádio Tupi) que um determinado jogador seria expulso. Dois minutos depois, “Pimba!” O cara levou o vermelho e ele me perguntou: “Como você sabia?” Eu sinto na hora. Na histórica final do Brasileiro de 1980 (Flamengo 3X2 Atlético-MG) eu disse na Rádio Nacional que a defesa do Flamengo estava deixando o Reinaldo solto porque ele estava machucado e que, mesmo mancando, ele faria um gol. E não deu outra.
Em relação ao jogo em si, não tem muito mistério. O futebol é muito repetitivo. E na minha época de repórter eu via jogos e treinos e conversava com os treinadores dos times daqui. Então se alguma coisa dava errado era mais simples de perceber.
TV/Rádio
Eu trabalhei em praticamente todas as emissoras de TV aberta: Tupi, Continental, Globo, Rio, Manchete, Bandeirantes, Record. Meu último trabalho foi na Record. Só num período muito curto, cerca de dois meses, em 99, entre o minha passagem como diretor de futebol do Flamengo e a vinda para a Tupi que eu fiquei apenas na TV, comentando jogos do Campeonato Carioca pela Bandeirantes, fazendo dupla com Edson Mauro (narrador, hoje na Rádio Globo). Depois eu passei a comentar apenas nos jogos de sábado, deixando o domingo para a rádio. Quando veio o Brasileiro, eles queriam que eu fosse para SP, mas eu recusei. O que eu gosto de fazer mesmo é rádio. Nunca deixei e jamais deixaria o rádio.
As TVs hoje estão todas em SP porque lá é que estão os grandes anunciantes. A Tupi abriu um escritório lá porque é onde você capta o dinheiro.
Hoje a TV fechada faz exatamente o que a gente fazia no rádio. O pré-jogo, com os vestiários, a chegada dos ônibus e depois os debates. A TV tomou isso para ela e as rádios aceitaram isso, não se impuseram. Deveriam ter ameaçado não transmitir mais.
As TVs de São Paulo estão fazendo de tudo para transformar os seus clubes nos mais populares do Brasil. E é possível porque foi o rádio que fez a popularidade dos times do Rio de Janeiro. Mas, se acontecer, vai demorar muito. E eu espero não estar vivo para testemunhar.
Futebol/Humor
Eu gosto muito do “Rock Bola” (transmitido de segunda à sexta, às 12 h, na Rádio Oi FM – 102,9 MHZ). Sempre ouço e às vezes participo. Eu valorizo muito o jovem, acho que ele tem um papel primordial nessa revolução tecnológica que já está acontecendo. A minha equipe aqui na rádio só tem jovens, porque eu aprendo demais com eles. De velho basta eu! (risos)
Brasileirão de pontos corridos
Eu acho essa fórmula chata demais. É muito longa, dura nove meses, o tempo de uma gestação, e os times começam de uma maneira, no meio mudam por causa da tal “janela” e no final já é outra coisa completamente diferente, com mudança de jogadores, treinador, etc.
A televisão é que inventou isso e agora está arrependida. Você pode reparar que o campeonato “casa” com a programação da TV, que “vira” em Abril, Maio, e segue até Dezembro. Para o rádio é ótimo, pois dura o ano todo e você tem como vender as cotas de patrocínio, pois quem paga sabe que todos os times ainda vão estar jogando.
Esse ano melhorou porque ficou nivelado por baixo. A distância entre o melhor e o pior está cada vez menor. Por exemplo, o São Paulo empatou no Morumbi com o Ipatinga e só não perdeu porque o juiz não deixou; o Fluminense deu uma paulada no Palmeiras e assim vai. Realmente aumentou a emoção, mas confesso que não acompanharia se fosse torcedor. Veria o Flamengo eventualmente, mas a partir do momento em que não tivesse mais chances de ser campeão, iria para o cinema. Não ficaria acompanhando para ver outro time ganhar.
Nos últimos anos tem sido difícil eleger o craque do campeonato. O último foi o Tevez, e veja que ele era grande destaque aqui e até hoje não conseguiu se firmar na seleção argentina.
Eu gosto é de final! Por que 30 segundos no Superbowl custam uma fortuna? É uma decisão garantida!
Superioridade paulista
Esta superioridade do São Paulo nos últimos anos é coincidência. Realmente o clube é organizado, mas não é nada do outro mundo. Vem dando é muita sorte com a arbitragem. Não dá para negar que eles são forte economicamente. É lá que está o dinheiro, o interior de SP é muito forte, ao contrário do Rio de Janeiro. Mas eu não vejo muita diferença técnica. Você pode ver que eles têm centro de treinamento, estrutura, mas vai contar quantos jogadores do time titular foram formados no clube.
O futebol é analisado em cima de resultados. Essa conversa de planejamento é sempre a mesma história: o time que vence é o que planejou. Se no ano seguinte esse mesmo clube chegar em oitavo vão dizer que virou uma bagunça. Antes o pessoal ia para Curitiba para visitar o Atlético-PR, que era considerado um exemplo de organização e hoje está lutando para não ser rebaixado. O Coritiba também tem estrutura e foi rebaixado; o Cruzeiro tem a Toca da Raposa, estava brigando pela liderança e tomou uma coça do Goiás. O que mudou, então?
O pessoal fala muito do Real Madrid, mas é um clube que deve o que não tem, já perdeu terrenos para o governo espanhol, agora teve que fazer uma recomposição financeira. A crise é mundial, rapaz! Se não tem dinheiro, não adianta! Eu sempre brinco dizendo que o lema do Flamengo é “O dever acima de tudo.” Ele deve a todo mundo! (risos)
Êxodo de jogadores
O que define é a moeda, porque o jogador é movido pelo dinheiro. Eles sabem que a carreira é muito curta e na primeira oportunidade eles se mandam. E os clubes permitiram isso. Agora há um movimento para mudar a Lei Pelé e preservar um pouco da qualidade dos nossos times.
Todo jogador tem uma cláusula contratual dizendo que se aparecer uma proposta do exterior ele pode ir embora. O Fluminense estava com um timaço, com Thiago Neves e Cícero, e se perdeu depois da saída deles. O que o Branco poderia ter feito para evitar isso? Antes você tinha como negociar o passe. Agora o clube vem, paga e leva.
Clube “blindado”
Isso é terrível! Hoje os “furos” eu é que consigo ligando direto para os dirigentes, jogadores, pelo meu conhecimento. O repórter que cobre o time é barrado pela assessoria de imprensa. Na época do Eurico eu tinha muito mais acesso à Presidência. Hoje para falar com o Dinamite o telefone passa antes nas mãos de vários assessores.
Agora tem que ir todo mundo para aquela sala com o símbolo do patrocinador ao fundo e mesmo que o Edmundo faça três gols, pode vir o Madson para a coletiva. Não sei quem é que define isso.
Jornalista-treinador
É preciso ter muita coragem para aceitar este desafio. Porque se você tem pretensão de voltar a ser comentarista, corre o risco de tomar três, quatro porradas de cinco, de seis, e depois você fica desmoralizado para analisar uma partida. Foi isso que minha mulher e alguns amigos me alertaram. Mas graças a Deus fiz boa campanha e terminou tudo bem.
Aprendizado
Nas duas vezes em que estive no Flamengo eu aprendi muito mais do que em todos esses anos como jornalista. Uma coisa é você comentar o que vê no domingo, outra é preparar tudo durante a semana. Hoje a minha crítica como analista é um pouco mais branda. Por exemplo, no último Vasco X Fluminense, o René Simões tirou o Fabinho e eu disse que era provável que o Vasco vencesse. E foi o que aconteceu (1 a 0, gol de Wagner Diniz). Depois do jogo, o técnico demonstrou arrependimento de ter feito a substituição, mas justificou alegando que o Fabinho é um jogador muito voluntarioso, estava ligado no jogo, já tinha o amarelo e o árbitro já tinha sinalizado que poderia expulsá-lo.
Você descobre o outro lado, os segredos da profissão que devem ser mantidos independente do que digam no rádio, na TV ou no jornal. Lá dentro você não vê apenas o produto final. Você vive a semana, sabe se o jogador brigou com a mulher, se tem algum problema pessoal... Na maioria das vezes o treinador é criticado e chamado de burro sem que se saiba exatamente o que ele planejou.
Dunga/Maradona
Sem querer desmerecer os trabalhos dos profissionais, até porque eu não tenho a formação deles, mas, honestamente, eu não acho que seja tão difícil. Basta formar uma comissão técnica de profissionais gabaritados que te “carreguem no colo”. Foi isso que eu fiz e que o Dunga e o Maradona podem fazer, pois também estão cercados de pessoas qualificadas.
A receita é saber ouvir. Se você achar que sabe tudo se arrebenta. Pior do que não saber é achar que sabe. O Maradona corre esse risco por ser muito auto-suficiente. E ele tem o Bilardo do lado dele, agora levou o Mancuso. Mas não tem muito segredo, não.
Roberto Dinamite
Não é porque o cara jogou muito que ele vai ser um bom presidente. Não sei se o Zico no Flamengo daria certo. O Roberto Dinamite já é um ídolo questionado no Vasco.
Inclusive, eu fui o responsável pelo interesse do Flamengo no Roberto em 1980. Eu estava na Rádio Nacional e liguei para o então presidente Márcio Braga e fiz a cabeça dele. Ele foi para Barcelona e deixou tudo acertado. Quando ele voltou, só contou pra mim. E eu, naquela coisa de dar o “furo”, acabei revelando no programa “No mundo da bola” na rádio e coloquei o Márcio no ar, que confirmou e disse que só faltava acertar o contrato. Na mesma hora o Eurico Miranda pegou um avião, chegou lá, rasgou aquela porra toda e o trouxe de volta para o Vasco.
Eu sempre digo para o Eurico que ele é o “culpado” do Roberto hoje ser o presidente. (risos) Se ele tivesse jogado no Flamengo, certamente ele não seria o ídolo que é no Vasco.
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Um comentário:
parabens pela entrevista com o washington!!! só tive tempo de ler com calma agora!!!
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